Artigo do leitor: Carlos Augusto em suas estações de saudade

por Carlos Britto // 03 de abril de 2015 às 15:10

carlos augusto amarizO radialista Marcelo Damasceno lembra, neste artigo enviado ao Blog, de histórias inesquecíveis de Carlos Augusto, antes mesmo de enveredar pela radiodifusão em Petrolina.

Confiram:

Antes da radiodifusão em solo dos sertões pernambucanos, algumas cidades incluindo Petrolina mobilizavam sua comunicação, seu comércio, sua vida em sociedade através de serviços privados de alto-falantes, a partir de um estúdio improvisado, uma engenhoca acoplando microfone, pickup para disco em vinil e cornetas afixadas em postes públicos. Em Petrolina esse serviço eletrônico   no início dos anos 1960 foi instalado, segundo informações investigadas e confrontadas por este signatário, em três diferentes endereços.

Mas sobressaía-se o estúdio ‘Brasil Publicidade’, de o ‘Menininho Sobral’, em conjunto com entusiasmado comunicador de voz em tom de barítono conforme o mercado exigia à época. Era Carlos Augusto Amariz Gomes, dividindo-se nas atividades de estudante do Colégio Dom Bosco e empreendedor no setor lojista de bicicletas. Venceu nessa disputa, o microfone, a comunicação que acordava com Petrolina diariamente. 

A Diocese de Petrolina, através de seu titular, Dom Antônio Campelo, estava em conversa com o Governo Federal, ainda na gestão de Juscelino Kubistchek, visando à concessão de uma emissora de rádio. Enquanto Carlos Augusto afinava sua voz, que nunca precisou de ‘truques’ eletrônicos, Dom Campelo encurtava seus voos para Brasília em avião ou entrecortava a Bahia e Minas para pressionar presidentes.  Em 1962, governava agora o Brasil Jânio Quadros.  Com sorte e reza, Dom Campelo arrancou autorização do presidente Quadros. E ele fez porque quis, ou seja, a Emissora Rural, hoje Rádio A Voz do São Francisco AM 730.

Torre fincada, rádio no ar e administração diocesana recrutara alguns locutores, entre estes o que viria a ser seu próprio ‘DNA’, a primeira carteira profissional registrada, o primeiro emprego em comunicação: Carlos Augusto.

Antes da Emissora Rural, porém, Carlos Augusto se juntava a outro brilhante comunicador do rádio regional, Osvaldo Benevides, recentemente falecido ainda na direção da sua Rádio Juazeiro, Bahia. Essa dupla protagonizou em alto-falante um jornal ‘falado’ denominado Revista Dominical. Carlos e Osvaldo, entre 1959 e 1962, ressaltavam a qualidade sonora, a voz nativa sem sotaque, sem frescura e sem influência de nada para tornar mágica a história das emissoras, hoje multiplicadas em frequência modulada e ondas médias.

Carlos Augusto, junto com a Emissora Rural, no ‘antigo’, e Rádio Grande Rio AM, neste Novo Testamento, soube juntar valores, oxigenar nossa antropologia de seca e de couro, de vaqueiro e cantorias, de sanfona e berrante, de rio e espécie animal, sobretudo o jumento, repartindo seu temperamento duro feito angico, sua alma de asa branca, seu olhar firme de catingueiro para tornar bela cada manhã brasileira dos sertões adentro.

Carlos lia a riqueza, mas comia no prato indesejado dos bêbados marginais em seu sabático jeito de juntar tocadores, bom e ruim, em quaisquer foles ou zabumba, no aço de qualquer triângulo e no que fosse mais inventado nessa orquestra de gente excluída. Carlos Augusto juntava multidões. Carlos corria mato adentro com tantos vaqueiros embandeirados para a Missa campal ou para o terço anônimo do ‘Pau de Leite’. Carlos era a reprodução invejável de todos os intérpretes de xote, do xaxado e do baião. Era Luiz Gonzaga encarnado no estúdio, mandando essa terra acordar que “já é meio-dia”.  A Radiodifusão hoje fica órfã do Boiadeiro do Rádio, que pegou seu gado e foi pra junto do seu bem, Jesus Sertanejo.

Adeus.

Petrolina, 02 de Abril de 2015, às 17horas e 45 minutos.

Marcelo Damasceno/Radialista

Artigo do leitor: Carlos Augusto em suas estações de saudade

  1. Lourinaldo Cavalcanti Andrade disse:

    Ontem no fim de tarde, acompanhei à distância, pela internet, com saudades, as celebrações da sexta-feira santa e o cortejo pelas ruas de Petrolina, do sepultamento do nosso Carlos Augusto. Quantas saudades deixará! Referencial no radiojornalismo de Petrolina, desde criança acompanhava sua voz firme, numa época sem internet, em que a cidade só dispunha do sinal da TV Aratu de Salvador, cheia de chuvisco e do jornal escrito “O Pharol”, o Repórter Somassa, todos os dias ao meio dia, era uma fonte única e importantíssima de informações! O imediatismo do rádio com tudo que ocorria no globo e em Petrolina, através das ondas médias e curtas da Emissora Rural, as notícias do mundo afora e também as locais, informando o progresso de Petrolina que chegava célere na voz de Carlos Augusto! Forró na Cuia Grande, Missa do Vaqueiro, Jecana! Petrolina sentirá sua falta, sua voz inconfundível e marcante! Missão cumprida Carlos Augusto! e com méritos! Que Deus o receba em paz!

    Lourinaldo Cavalcanti Andrade

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Últimos Comentários

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