O advogado Robson Lemos Santana resolveu entrar na polêmica acerca do pedido protocolado no Ministério Público Federal (MPF), pelos pastores Jorge Ancelmo e José Kenaidy, para a retirada das esculturas da Mãe d’água e do Nego d’água do Rio São Francisco. E ele contesta veementemente os dois evangélicos, considerando “desnecessária” toda essa polêmica.

Confiram:

Ouço e leio com muita consternação ao que nos últimos dias, como a anos atrás, vem causando grande discussão em Petrolina. A estátua de uma sereia sobre pedras no Rio São Francisco. Uma polêmica totalmente desnecessária, e que desde sua instalação vem incomodando. Agora, incomodando a quem? O que demais tem uma obra de concreto para tanto alarde?  Alguns parlamentares locais intitulam de figura demoníaca, e até como sendo a responsável pela seca do nosso bem mais precioso.

Hoje (ontem), quando liguei o rádio fiquei abismado com a completa ignorância dos autores de um manifesto que foi encaminhado ao Ministério Público, questionando a legitimidade do município em intervir num bem da União. Foram veementemente citado artigos da Constituição de 1988 para argumentar o ato, que estaria eivado de completa inconstitucionalidade, e pede que se tomem providências para a retirada da obra que causa poluição visual, espiritual, ambiental. Diante dessa insanidade eu fiquei e estou completamente indignado em como alguém tem a capacidade de usar seu tempo para provocar desconfiança institucional e afrontar a cultura ribeirinha, numa completa demonstração de confusão entre folclore e religião.

Não tenho nada contra nenhuma religião. Sou católico, mas tenho grande admiração pela comunidade evangélica, que sabe como ninguém proclamar a Palavra. Mas me preocupa quando pastores vão a público reclamar perante à sociedade de uma insatisfação individual motivada por convicção religiosa. Senhores, vamos com calma.

Pessoas que se dizem cristãs, antes de proclamar ensinamentos, devem primeiro praticá-los. Curioso como algo imóvel e inofensivo causa indignação em alguns, enquanto a mão do homem, um ser “racional”, é o que vai realmente nos destruir. Essas pessoas deveriam ser capazes de usarem suas influências para mostrar indignação e repúdio ao assoreamento do rio, destruição da mata ciliar, às construções de condomínios nas margens, aos dejetos jogados nas águas, à falta de política pública de revitalização, ao desperdício da população, sem contar a outras mazelas como violência e saúde.

Interessante será quando acabar (que Deus nos livre), a água do Velho Chico. Ainda estarão remoendo a história da solitária sereia petrolinense, cujo admirador, vulgo Nego d’água, fica torcendo para que ela não o abandone.

A confusão é tamanha que não sabem nem do que se trata a imagem. Ali é a representação da Iara, lenda Tupi, que possui uma história muito bonita de uma indígena trabalhadora, mas que pela inveja dos homens foi condenada a atormentar os pescadores. Nada tem a ver com Iemanjá, símbolo do candomblé, intitulada de Rainha do Mar. Que eu saiba, nós temos um rio. E mesmo que fosse, que intolerância se configuraria, não?

Eu tive um trabalho de apenas dois minutos para pesquisar a respeito dessa lenda. E esses críticos com concepções arcaicas? Algo relativo ao folclore, à cultura ribeirinha e brasileira, algo que alguns querem exterminar. O Nego d’água e a Iara estão ali para nos lembrar das tradições, da identidade de um povo, de algo que nos traz reflexão e ensinamentos para o cotidiano.

O Brasil é a “zona” que se encontra porque somos criados na base da hipocrisia e do ego. A gente precisa de cultura, educação, de propagação de ética, de exemplos de cidadania. Um povo sem cultura é um povo manipulado e estagnado. Qual vai ser nossa identidade daqui aos próximos 20, 30, 100 anos? Só uma cópia do “capitalismo e seus blue caps”. Temos que ter cuidado também com a mídia. Altamente tendenciosa e sensacionalista, tem alguns profissionais que mereciam uma aula de direito constitucional para parar de tanta asneira que obriga ao povo sem instrução à acreditar.

Graças à Deus somos uma democracia. Mas é preciso estar atento ao filtrar opiniões. Inclusive até a minha que aqui externo.

Fico na torcida para que os membros do Ministério Público não se ocupem com uma ridicularidade dessas, em comparação ao que a sociedade realmente espera de sua atuação de fiscal da lei. Nem mesmo esse órgão tem tamanha legitimidade. Se for o caso de retirada, que a população de Petrolina possa decidir sobre isso. Afinal os argumentos de inconstitucionalidade caem por terra na própria Constituição.

Fica meu desabafo!

Robson Lemos de Santana/Advogado

(foto Nego d’água/reprodução)