Transposição do rio São Francisco: um erro imperdoável, artigo de João Suassuna

por Carlos Britto // 19 de março de 2009 às 23:00

Muitos têm-nos perguntado por que somos contrários ao projeto da transposição do rio São Francisco, existindo, no país, exemplos de transposições que deram certo, como aquela realizada no rio Paraíba do Sul, para o abastecimento da cidade do Rio de Janeiro. A resposta a esse tipo de questionamento já foi dada por Alberto Daker, eminente professor catedrático de Hidráulica Agrícola (aposentado), da Universidade de Viçosa (MG), autor de uma obra de significativa importância nessa área, a qual é sugerida como roteiro de estudos por diversas universidades de ensino agrícola espalhadas pelo país. Segundo Daker, existem três condições básicas que justificam a transposição de águas de um rio: existirem uma bacia com muita água sobrando e terras e relevo que não sirvam para irrigação; outra bacia com terras irrigáveis, mas com carência de água e uma relação custo-benefício viável para a realização da obra. Para o caso do abastecimento do Rio de Janeiro, essas alternativas se enquadraram perfeitamente na transposição ali realizada. Já para a transposição do São Francisco, as três não se enquadram, tendo em vista haver demanda por água nas terras cultiváveis próximas ao rio; existir água na região das bacias receptoras, faltando apenas o estabelecimento de uma política eficiente para a sua distribuição e posterior consumo das populações e, por último, faltar sustentação energética e financeira para a execução da obra. Como técnico usuário da obra de Daker, estamos montados nesse tripé há décadas, analisando o projeto da transposição, tendo isso resultado na realização de um expressivo acervo de artigos sobre o tema.

Por outro lado, no cenário político nacional, entendemos que as autoridades têm plena convicção do real significado dessas condições para o processo transpositório, tão bem explicitadas por Daker em sua obra, o que tem sido demonstrado por elas nas campanhas políticas regionais, com o propósito de se conhecer a realidade da região para elaboração das propostas de desenvolvimento. Porém, na nossa ótica, iniciado o projeto da transposição, o presidente Lula, apesar de nordestino e conhecedor desses condicionamentos, tem dado provas de ter-se dobrado às vontades políticas de sua base aliada, notadamente à do Ceará, estado que possui a metade das águas de superfície do Nordeste (cerca de 18 bilhões de m³, distribuídos em mais de duas centenas de açudes), conforme consta no Portal da Secretaria de Recursos Hídricos daquele estado. É a prova inequívoca da pressão política voltada para os interesses do agro e do hidronegócio.

João Suassuna – Engº Agrônomo e Pesquisador da Fundação Joaquim Nabuco, colaborador e articulista do Ecodebate.

Veja o artigo na íntegra aqui: http://www.ecodebate.com.br/2009/02/10/transposicao-do-rio-sao-francisco-um-erro-imperdoavel-artigo-de-joao-suassuna/

Transposição do rio São Francisco: um erro imperdoável, artigo de João Suassuna

  1. nanuca disse:

    Concordo com Suassuna. Faço ressalva apenas ao estado da Paraiba que realmente não tem água. O futuro que comprovará tudo isto está muito próximo. Afinal a obra está em andamento. Os custos são enormes em relação ao que se teria no desenvolvimento de outras alternativas para o estado do Ceará. Este estado é privilegiado, depende de recursos financeiros lá dentro do estado.

  2. Pe. Antonio disse:

    Precisamos do espaço do blog para materia como essa esclarecedora. Parabéns. Mas nosso Suassuna, vem dizendo isso há muito tempo. Uma posição técnica séria. Concordo com tudo o que escreveu. Vejamos a conclusão que faz: “O presidente Lula, apesar de nordestino e conhecedor desses condicionamentos, tem dado provas de ter-se dobrado às vontades políticas de sua base aliada, notadamente à do Ceará, estado que possui a metade das águas de superfície do Nordeste (cerca de 18 bilhões de m³, distribuídos em mais de duas centenas de açudes), conforme consta no Portal da Secretaria de Recursos Hídricos daquele estado. É a prova inequívoca da pressão política voltada para os interesses do agro e do hidronegócio.

  3. João Jodélio disse:

    A transposição das águas do velho chico é uma obra puramente eleitoreira, atendendo aos políticos cearenses. Os povos ribeirinhos não foram ouvidos. Aqui em Belém do São Francisco, a 20 km não tem água. Várias fazendas de Cabrobó não terão esse privilégio. Outra questão federal é com relação a Chesf que deixou um rastro de
    trabalhos não concluídos. Os assentados choram até hoje à espera de uma compensaçao.

  4. Opara disse:

    Até hoje, não entendi a lógica do governo quanto aos beneficiários. Ele fala em 12 milhões. Ocorre que nos quatro estados envolvidos pela transposição, a população não chega a 24 milhões. O governo quer que a gente acredite que efetivamente as águas do São Francisco vai chegar a mais de 50 % da população dos quatro Estados!!! se levarmos em conta que a população ribeirinho não vai receber essa água, a porcentagem aumenta. Às margens do rio São Francisco existem mais de 1 milhão de terras agricultáveis, ou seja, boa para o cultivo, já delineado pelos próprios órgãos do governo. Terra que nem todas as águas do rio seriam suficiente para irrigá-los.

  5. Feeling disse:

    Quanto descaso desses nossos governantes. Existem coisas no Brasil que se o caba não tiver paciencia …sai revoltado pelas ruas gritando misérias. As cotas, a transposição, a falta de educação, o preconceito… eu sinceramente não tenho orgulho nenhum de meu pais, amo meu Juazeiro, meu Nordeste, mas não gosto de meu pais.Tá na cara que essa transposição não vai dar certo em estado algum, ja houveram muitos casos assim em paises de primeiro mundo, e todas falhas. Bom se algo der errado saberemos quem culpar!

  6. João Suassuna disse:

    Apenas uma sugestão para o cidadão “Feeling” que fez suas considerações nesse Blog. Não deixe de gostar do nosso País. Nosso Juazeiro vai continuar maravilhoro, bem como Petrolina e todo o Nordeste brasileiro. Os governantes de hoje, poderão não estar no poder, amanhã. O povo brasileiro é muito mais poderoso e importante do que tudo isso que está rolando por aí. Vamos continuar tendo orgulho de nossa nação. Um abração.
    O autor desse artigo

  7. Feeling disse:

    Obrigado Suassuna, mas poxa tem muitas coisas revoltantes, não quero ver esse Rio morrer, amo muito ele… a nossa região é linda não merece tal descaso! Obrigado pelo toque.

  8. Pernambucana com orgulho disse:

    Isso foi uma das maiores atrocidades com o meio ambiente e uma verdadeira eutanásia com o Rio São Francisco. Fui, sou e sempre serei contra essa transposição. Por que o governo federal não investe em procurar poços p/ perfurar e achar água p/ o povo que morre de sede? com água, as pessoas podem trabalhar. Porque investir no probre p/ aliviar seu sofrimento? Lhe dou a resposta: Porque não vale a pena. O unico retorno é o voto daqueles que recebem o bolsa familia, que são dependentes desse tipo de assistencialismo. E assim os poderosos perderiam a boquinha de receber das empresas que ganharam a concorrencia nacional, sua bolada mensal vinda do dinheiro público que é meu seu, de todos que pagam impostos absurdos de altos. E sendo assim, os milhões de votos do nordeste estarão garantidos para a próxima eleição. Feliz dos Estados “UNIDOS” da América que receberam de Deus um homem como Barack Obama. O cara prometeu e está cumprindo as suas promessas de campanha aos poucos, passo a passo. Lula deveria estagiar com ele; Ainda há tempo de aprender alguma coisa. É revoltante a agressão com o nosso rio.

  9. Feeling disse:

    Concordo plenamente com “Pernambucana com orgulho”, eu voto em Lula e no PT , sempre votarei… mas admito que essa do governo é imperdoável…

  10. Paulo Afonso da Mata Machado disse:

    Prezada Pernambucana com Orgulho:
    A perfuração de poços artesianos não é alternativa ao projeto de transposição.
    Quando se utiliza a água subterrânea, a primeira providência é verificar se as condições de recarga são suficientes. Se não forem, seguramente vai ser retirada mais água que o solo consegue armazenar. É mais ou menos como se você tiver uma reserva de R$ 100.000,00 e retirar todos os meses R$ 5.000,00, tendo um salário de R$ 1.000,00. Passado algum tempo, essa poupança vai acabar.
    O subsolo do Nordeste tem 60% de solo cristalino, muito pobre de água. No restante, principalmente no estado do Piauí e na orla litorânea, há uma reserva de água que, se usada de forma predatória, vai causar sérios problemas à região. Para você se informar melhor, sugiro ler o EcoDebate de sábado último, onde há um interessante artigo do geólogo Álvaro dos Santos tratando dessa questão.

Deixe um comentário

O seu endereço de e-mail não será publicado. Campos obrigatórios são marcados com *


Últimos Comentários