À primeira vista, o chão por vezes com aspecto seco e a vegetação rala da caatinga podem enganar os desavisados. Mas por trás da aparência supostamente inóspita e resistente que ainda permeia a imaginação de senso comum sobre o bioma tipicamente nordestino, pulsa um dos maiores trunfos ambientais do Brasil na luta contra o aquecimento global. Estudos recentes revelam que o bioma semiárido, único do mundo exclusivamente brasileiro, é surpreendentemente eficiente na captura de carbono – processo fundamental para reduzir os níveis de CO₂ na atmosfera.
E é exatamente nesse contexto que a Superintendência de Desenvolvimento do Nordeste (Sudene) tem se colocado na linha de frente da proteção e valorização desse patrimônio natural, cuja importância é celebrada nesta segunda (28), Dia Nacional da Caatinga.
Ao contrário do que se poderia sugerir para um bioma que carimba a paisagem de uma região semiárida, a vegetação da caatinga é altamente eficiente no processo de fotossíntese. “Mesmo sendo um bioma de clima seco, a Caatinga tem mostrado uma capacidade extraordinária de ajudar nesse equilíbrio climático. As plantas são verdadeiras especialistas em aproveitar cada gota de chuva: quando chove, elas rapidamente ‘acordam’, crescem e realizam uma intensa fotossíntese, retirando grandes quantidades de CO₂ da atmosfera em pouco tempo“, explica o professor John Elton Cunha, do Centro de Desenvolvimento Sustentável do Semiárido da Universidade Federal de Campina Grande (UFCG).
O pesquisador também destaca a Caatinga como um dos ecossistemas mais eficazes da América do Sul neste serviço ambiental. “Enquanto a Amazônia é reconhecida por sua capacidade contínua de absorver carbono ao longo do ano, a caatinga se notabiliza pela velocidade e eficiência com que realiza esse processo em seus ciclos sazonais”, comentou.
Desde 2010, o Observatório Nacional da Caatinga – uma rede multidisciplinar integrada por 13 universidades brasileiras, seis institutos de pesquisa e cinco instituições internacionais -, parceiro da Sudene, monitora a dinâmica do carbono, da água e da energia no Semiárido brasileiro, por meio de torres instaladas em áreas de vegetação nativa e pastagens.
Os resultados indicam que, em áreas de Caatinga hipoxerófila (mais úmidas), o sequestro de carbono pode chegar a 5 toneladas por hectare/ano. Já em áreas hiperxerófilas (mais secas), a média varia entre 1,5 e 2,5 toneladas. Outro dado diz respeito à eficiência no uso do carbono: a caatinga retém, em média, 45% do CO₂ absorvido, superando todos os outros tipos de florestas estudadas até hoje. Em termos de eficiência hídrica, o bioma também se destaca, fixando entre 2,7 e 5,2 kg de CO₂ por metro cúbico de água transpirada.
Prioridade
Reconhecendo essa importância estratégica, a Sudene colocou a preservação da caatinga como prioridade no Plano Regional de Desenvolvimento do Nordeste (PRDNE), política que regionaliza as ações de desenvolvimento social e econômico previstos no Plano Plurianual (PPA) do governo federal. A autarquia também está na linha de frente da revisão dos Planos Estaduais de Combate à Desertificação, investindo R$ 1,5 milhão em parceria com o Ministério do Meio Ambiente e Mudança do Clima (MMA) e a Universidade Federal do Vale do São Francisco (Univasf). Essas ações visam fortalecer os instrumentos de gestão e preparar o Brasil para debates internacionais cruciais, como a COP30, garantindo que a voz em defesa do bioma seja ouvida.
Paralelamente, a Sudene também aposta na bioeconomia como vetor de desenvolvimento sustentável. Através de iniciativas como a Rede Impacta Bioeconomia, lançada com as universidades federais de Pernambuco (UFPE) e do Vale do São Francisco (Univasf), a superintendência vinculada ao Ministério da Integração e do Desenvolvimento Regional busca valorizar a rica biodiversidade local e aperfeiçoar o manejo praticado por agricultores familiares e cooperativas instaladas no território. O projeto visa a identificar e utilizar plantas da caatinga para a produção de bioinsumos e até medicamentos, gerando renda e fortalecendo cadeias produtivas baseadas no uso sustentável dos recursos naturais.