Artigo do leitor: “O que temos hoje em Curaçá?”

por Carlos Britto // 29 de setembro de 2017 às 21:06

Sede da Prefeitura de Curaçá-BA. (Foto: Reprodução)

Neste artigo, o leitor Esmeraldo Lopes conclama os cidadãos de Curaçá, no norte da Bahia, a exigirem do Poder Público Municipal uma atuação rigorosa quanto a questões ambientais como coleta de lixo e tratamento do esgoto, e não se sujeitarem a substituir um papel que é dos órgãos públicos.

Boa leitura:

Imaginem, leitores ou ouvintes dos leitores, os benefícios que crianças, adolescentes, jovens e adultos de Curaçá proporcionariam à cidade, se ao invés de catar lixo alheio na beira do rio ou em qualquer outro lugar, aplicassem a mesma energia e a mesma articulação para exigir que o poder público cumprisse seu papel através de suas várias esferas e setores; que os moradores cumprissem suas obrigações civis e adotassem postura de responsabilidade ante o espaço coletivo e privado. Fiquemos apenas no campo da limpeza pública e do saneamento, questão em discussão.

O que temos hoje em Curaçá? temos a Prefeitura em descumprimento de seu dever de estruturar e operacionalizar os mecanismos de limpeza pública e coleta e tratamento do esgoto; de disciplinar a população e fiscalizar o cumprimento das normas concernentes ao assunto. Temos a irresponsabilidade, quase generalizada, dos moradores da cidade no que diz respeito aos cuidados com o lixo.

Na rua, sem nenhum nível de constrangimento, joga-se bitucas de cigarros, copos, sacos plásticos, tampa de cerveja, restos de lanche e tudo o mais o que as pessoas queiram descartar. Faz-se uma festa em espaço público e, ao seu término, a bagaceira voando, esparramando-se pelo chão. Comerciantes quase sempre não se responsabilizam pelo lixo concernente às suas atividades e gerado por seus clientes.

O esgoto… Bem! As mesmas pessoas que estão catando lixo, reclamando de quem lava carro no rio não podem deixar de lembrar que suas fezes, os resíduos de óleo de seus veículos lavados nos postos ou em suas casas, detergente, sabão e óleo utilizados em suas residências e nos restaurantes, são lançados no rio. E são lançados em estado bruto, visto que o esgoto não é tratado, ainda que exista na cidade uma lagoa de estabilização.

Se assim é, para ser coerente, para não sujar o rio, seria necessário que as pessoas não utilizarem banheiro e nem pia. Coisa inviável, não é? Digo isso porque quero que essas pessoas percebam que cuidar bem do rio, da natureza, requer muito mais do que boa intenção, coração bondoso. Exige olhar ativo, realmente crítico. Pode e necessariamente requer luta, raiva, criação de inimizade; atrai ódio; gera motivo para perseguição.

Nunca acreditei nas pessoas boazinhas. Elas são sempre e infalivelmente muito, muito canalhas. E quando não são canalhas são ingênuas demais. Como Curaçá está situada na área de influência de Juazeiro, eu entendo o motivo do pensar de curaçaenses com relação ao que aqui está sendo tratado. Li, outro dia, uma reportagem que se referia a estudantes da Uneb, da UPE e membros de Centros Espíritas em atividade de catar lixo na beira do rio, alegando que estavam em ato de cidadania. Coitados! Sigam o exemplo deles não!

Catar lixo, praticar ato de caridade, de solidariedade, nunca foi e nunca será atitude cidadão. É verdade que esta imagem vem sendo passada pela imprensa, pelos desinformados, por políticos maliciosos, manipuladores e até por certas “universidades”.

Há quem diga que cidadão é o habitante da cidade, mas isso não é correto. Cidadania diz respeito à participação ativa em questões relacionadas aos aspectos políticos da vida pública, na contestação do que é, na definição que se quer para a sociedade, na luta pela derrubada ou criação de direitos e deveres políticos, sociais, civis.

Cidadania implica luta, conflito, vez que todo ato cidadão conduz necessariamente a postura de confronto. Confronto entre quem deseja que o espaço de vida, o direito, o dever, o costume seja de determinada forma (mantido ou alterado) e o outro que tem querer, interesse, diferente.

Voltando ao início. Se os organizadores do movimento que está mobilizando pessoas para catarem lixo na beira do rio em Curaçá, convocarem o prefeito e exigirem (não pedir, exigir) que a Prefeitura faça sua parte no que diz respeito à coleta, fiscalização, aplicação do Código de Postura; se convocarem os diretores escolares e cobrarem deles orientação educacional voltadas para a modificação dos costumes herdados pelos jovens e que os levam a ter posturas reprováveis no campo da higiene e da vida no espaço público; se convocarem o prefeito, o presidente da Câmara de Vereadores, o Ministério Público e o SAAE para exigir, seriamente, o tratamento do esgoto; e se, através de meios de comunicação e campanhas nas ruas, repreenderem as pessoas, os comerciantes que jogam lixo no espaço público…aí sim, haverá uma atitude cidadã e os resultados não apenas serão muito efetivos, no que diz respeito ao que se reivindica e diretamente quer, como produzirão repercussões grandiosas sobre todas as dimensões da vida política, civil e privada. Entretanto, quem age assim, com vitória ou com derrota, sempre sairá arranhado, quando não profundamente ferido.

Esmeraldo Lopes/Leitor

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