Embrapa vai em busca de parceria com empresas para sobreviver sem Orçamento federal

por Carlos Britto // 11 de fevereiro de 2022 às 09:51

Foto: Fernanda Birolo/arquivo

A Empresa Brasileira de Pesquisa Agropecuária (Embrapa), estatal com papel preponderante no desenvolvimento do agronegócio brasileiro, prepara uma grande reestruturação que deve mudar sua face nos próximos anos. O projeto envolve corte de custos e redução de despesa com pessoal. Paralelamente, entrará em vigor um novo modelo de parceria com o setor privado que pretende tornar a empresa autossustentável, para não ter mais de depender dos recursos do Orçamento federal – sempre submetidos ao humor do governo e do Congresso – para sobreviver.

Segundo o presidente da Embrapa, Celso Moretti, um dos pilares do plano é um novo modelo de negócios: associar-se a empresas privadas que colocarem no mercado os produtos desenvolvidos em seus centros de pesquisa e, dessa forma, obter os recursos necessários para sua operação.

Atualmente, a Embrapa recebe apenas royalties pelos produtos que desenvolve. Mas, tornando-se sócia das empresas, Moretti acredita que poderia arrecadar, num prazo de 5 anos, o suficiente para não depender do governo – em 2020, a operação custou cerca de R$ 350 milhões. “Nós entregamos valor, mas capturamos muito pouco”.

Como exemplo, ele citou a Bioma, que comercializa o BiomaPhos, um bioinsumo produzido a partir de pesquisas da Embrapa. “Eles faturaram aproximadamente R$ 100 milhões e pagaram R$ 4 milhões para a Embrapa. Se fôssemos sócios com 50%, receberíamos R$ 50 milhões. Mesmo tendo 30%, seriam R$ 30 milhões”.

Ele afirma, porém, que a Embrapa continuará cumprindo seu papel social. “Temos orçamento público que financia ações públicas de desenvolvimento, e esses resultados são transferidos sem custos para a sociedade brasileira. Isso vai continuar acontecendo.”

Economia

A Embrapa prevê atingir, em até 12 anos, uma economia de mais de R$ 320 milhões por ano com o Transforma Embrapa. Segundo Celso Moretti, com as mudanças a empresa ficará mais ágil e eficiente. “A empresa poderá gastar mais energia com aquilo que é importante: desenvolver soluções para resolver os problemas do agronegócio brasileiro”, afirma. A reorganização da estrutura da estatal, que vem sendo discutida e implementada há alguns anos, ganhou corpo após um trabalho da consultoria Falconi, iniciado em agosto do ano passado e que deve ser concluído em março.

As primeiras economias vêm do corte de custos na sede da Embrapa. Segundo Moretti, é possível economizar R$ 4 milhões, de um custo total de R$ 15 milhões. Já para o médio prazo, de um a três anos, a economia é de R$ 18,6 milhões e virá do redesenho da organização, principalmente na sede, mas com reflexo nas unidades. Está prevista a criação de um centro de serviços compartilhados, que substituirá áreas administrativas das unidades. “O centro vai gerenciar a operação da empresa em todo o Brasil”.

Segundo Moretti, com o centro será possível eliminar até 35% das funções comissionadas. A empresa cairá de 640 cargos comissionados, que preveem remuneração adicional, para 420. “Mas não existe, nos planos da empresa, demissão de empregados”, afirma. No longo prazo, a empresa prevê a saída de 840 funcionários por conta do limite de idade de 75 anos para a aposentadoria compulsória no setor público. Isso geraria uma economia de quase R$ 300 milhões a partir do 12.º ano.

Moretti diz, porém, que a Embrapa vai negociar com o Ministério da Economia a possibilidade de outro Plano de Demissão Incentivada (PDI). A perspectiva é de saída de funcionários de apoio, que trabalham em campos experimentais, laboratórios e na administração. “A ideia é avançar com a terceirização, para que foquemos a contratação de pessoas da atividade-fim, que são pesquisadores e analistas”. Atualmente, a Embrapa tem cerca de 8 mil funcionários.

Risco

Para Pedro de Camargo Neto, ex-presidente da Sociedade Rural Brasileira (SRB), no entanto, a mudança de modelo na Embrapa pode ser arriscada. “A pesquisa pública, no sentido de pesquisar o necessário para o futuro da agricultura brasileira no longo prazo, não necessariamente é resultado de investimento privado, quer seja do limitado capital nacional em pesquisa, quer seja dos capitais internacionais que nem sempre têm o mesmo objetivo nacional de longo prazo”, disse. Camargo Neto já integrou o conselho da Embrapa – saiu após divergências.

O presidente do Sindicato Nacional dos Trabalhadores de Pesquisa e Desenvolvimento Agropecuário (Sinpaf), Marcus Vinicius Sidoruk Vidal, alega que a reestruturação é proposta no “é mais do mesmo”. “Em 2018, aconteceu outra experimentação semelhante com as mesmas supostas economias, e que só resultou em desorganização institucional”. Vidal diz que a Embrapa não tem “grandes problemas de gestão”. “O problema da Embrapa é a redução do seu orçamento para pesquisa”. (Fonte: Estadão)

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