Artigo do leitor: “Para que servem datas alusivas?”

por Carlos Britto // 02 de junho de 2016 às 14:33

vitorio (2)Incomodado com a falta de ações práticas, o ambientalista Vitório Rodrigues decidiu escrever um artigo ao Blog para questionar os resultados de tantas datas alusivas ao Meio Ambiente. Segundo ele, atualmente, existem 40 datas comemorativas, “que na sua maioria só servem para quem não faz nada o ano inteiro”.

Acompanhem:

Desde quando o homem branco “achou” o Brasil, começou a destruição das matas. Tudo começou quando um deles, ninguém sabe quem, mas talvez por ordem do D. Henrique de Coimbra, resolveu cortar a primeira árvore para fazer uma cruz e colocá-la próximo ao altar para a celebração da primeira missa no Brasil. Isso é o que diz a história. O que provavelmente aconteceu e ninguém conta é que há uma grande possibilidade das mesmas embarcações que trouxeram os cerca de 1.200 homens da comitiva de Cabral, inclusive o “santo homem” que veio realizar o primeiro ato religioso do homem branco na terra descoberta, tenham voltado para Portugal carregadas de contrabando de pau-brasil adquirido dos nativos, em troca de bijuterias de pouco valor, “espalhando a corrupção na terra” dos Tupis-guaranis, Tupinambás, Tapuias, Cataguares, Tabajaras e muitos outros.

De lá para cá o Brasil vem ficando cada vez mais desnudo, perdendo sua cobertura vegetal pela ganância dos grandes madeireiros, para grandes e pequenos agricultores, pecuaristas e para os incêndios acidentais ou provocados, que ocorrem nas épocas de estiagens prolongadas.

Um grande exemplo de devastação é a Mata Atlântica, que hoje resta apenas um pouco mais de 5% em toda sua extensão. Os outros biomas como o cerrado e a caatinga, somando à produção de lenha para as cerâmicas e indústrias, produção de carvão e outros danos, a floresta amazônica – além da devastação para dar lugar à agricultura e a pecuária, há também a produção de madeiras nobres para abastecer boa parte do mundo e, com isso, o processo de devastação já é bastante avançado.

Por conta dessas agressões, sobretudo o Nordeste já experimenta conviver com mais um grande problema: a desertificação. E quase nada tem sido feito para barrar esse processo. Apenas nas datas comemorativas é que governantes, instituições afins e população lembram-se de realizar ações, na sua maioria sem perspectiva de resultados concretos quem venham beneficiar o ambiente em que vivemos.
Ano após ano, se comemora datas e mais datas que se dizem estar protegendo a natureza. Veja elas abaixo e faça seu juízo de valor:

11 de janeiro – Dia do Combate da Poluição por Agrotóxicos;
02 de fevereiro – Dia Mundial das Zonas úmidas;
06 de fevereiro – Dia do Agente de Defesa Ambiental;
22 de fevereiro– Aniversário do IBAMA;
1º de março – Dia do Turismo Ecológico.
02 de março – Aniversário do serviço Florestal Brasileiro – SFB;
16 de março – Dia Nacional da Conscientização sobre as Mudanças Climáticas;
21 de março – Dia Mundial Florestal;
22 de março– Dia Mundial da Água;
15 de abril – Dia da Conservação do Solo;
17 de abril – Dia Nacional de Botânica;
22 de abril – Dia da Terra;
28 de abril – Dia da Caatinga;
03 de maio – Dia do Solo e do Pau-Brasil;
05 maio – Dia do Campo;
22 maio – Dia Internacional da Biodiversidade;
27 de maio – Dia da Mata Atlântica;
05 de junho – Dia Mundial do Meio Ambiente;
08 – Dia Mundial dos Oceanos;
17 de junho – Dia Mundial de Combate à Desertificação;
10 julho – criação do Fundo Nacional do Meio Ambiente;
12 de julho – Dia do Engenheiro Florestal;
17 de julho – Dia da Proteção das Florestas;
14 de agosto – Dia do Controle da Poluição Industrial;
28 de agosto – Aniversário do Instituto Chico Mendes de Conservação da Biodiversidade – ICMBio;
03 de setembro – Dia Nacional do Biólogo;
05 de setembro – Dia da Amazônia;
11 de setembro – Dia Nacional do Cerrado;
16 de setembro – Dia Internacional de Preservação da Camada de Ozônio;
20 de setembro – Dia Internacional da Limpeza de Praia;
21 de setembro – Dia da Árvore;
22 de setembro – Dia da Defesa da Fauna;
03 outubro – Dia Nacional das Abelhas;
04 de outubro – dia do Rio São Francisco;
05 de outubro – Dia das Aves;
12 de outubro – Dia Mundial para a Prevenção de Desastres Naturais e Dia do Mar;
15 de outubro – Dia do Consumo Consciente;
16 de outubro – Dia Mundial da Alimentação;
19 de novembro – Aniversário do Ministério do Meio Ambiente;
19 de dezembro – criação da Agência Nacional de Águas – ANA.

São 40 datas que, na sua maioria, só servem para quem não faz nada o ano inteiro, montar um cenário para filmar e tirar algumas fotos e colocar nas redes sociais e TV, para dizer que está fazendo alguma coisa. Resultado concreto que é bom, nada. Quando muito, se planta meia dúzia de mudas e deixa morrer de sede; se faz uma limpeza simbólica numa determinada área e só aparece lá de novo um ano depois. Os órgãos governamentais inventam projetos que, às vezes, chegam a nos animar, nos fazendo acreditar que vai ter bons resultados. Ledo engano. A maioria deles tem início, não tem meio, não tem fim e nem continua…

Enquanto isso, nossos rios continuam sendo brutalmente degradados, os solos contaminados e salinizados rumo à desertificação, as matas destruídas, o ar cada vez mais irrespirável, nossa saúde sendo comprometida pela alimentação produzida à base de agroquímicos altamente perigosos, e tudo que deveria ser feito todos os dias para minimizar os impactos destruidores do meio ambiente e, consequentemente, de nossa saúde, não é feito nem nessas datas instituídas para tal finalidade. Por estas e outras razões, não me sobra nenhuma outra opção de resposta para a pergunta feita no enunciado sobre as datas comemorativas ao meio ambiente: com poucas exceções, ELAS NÃO SERVEM PARA NADA!

Vitorio Rodrigues/Ambientalista

Artigo do leitor: “Para que servem datas alusivas?”

  1. Silvana disse:

    Texto cheio de conteúdo, escrito por um ambientalista digno de assim ser chamado. Vitório Rodrigues é um incansável na luta pela preservação do meio ambiente, um homem que está atento e preocupado o ano inteiro com essa causa, e não em uma data específica, para aparecer na mídia. A triste situação do Rio São Francisco, hoje presenciada por todos, foi anunciada por ele há muuuuuuuito tempo e eu lembro que alguns comentavam que Vitório era exagerado . Infelizmente não era exagero, as consequências estão aí para todo mundo ver.

  2. Luiz Amora disse:

    Vitório Rodrigues parabens pelo seu trabalho. Gostaria só para exemplificar com um fato bem próximo de nós, e que desagua no Rio São Francisco, uma fosse´`a Céu Aberto, o CANAL DO ALTO CHEIROSO, NOME ALUSIVO A FEDENTINA que esse canal exala para os moradores do Bairro São José.

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