O velho trator e a podóloga

por Carlos Britto // 28 de dezembro de 2022 às 18:00

Hoje (28) foi dia de visitar Socorro, excelente podóloga que me livra de uma de minhas maiores aflições. Ela estava entre serena e emocionada e me contou uma história tão linda quanto tocante.

Geraldo Coelho aparecia sempre lá para cuidar das unhas que incomodavam. Levava a esposa, Dona Loudes, que ficava na cabine ao lado com a colega dela. O ritual era sagrado, vinham os dois juntinhos e cada um no seu cantinho com sua própria profissional. E Dr. Geraldo gostava dela, contava histórias, reclamava, dava uns gritos, risadas. Mas também a visitava na casa que vive com sua família no N-7, claro, sem avisar. Gritava da porta: “vim tomar café”. E entrava com tudo já se abancando na mesa. Era assim o “trator” do Sertão. Às vezes, levava um neto: “Esse veio da Europa e veio tomar um café do Sertão por aqui”.

Quando a doença avançou, Socorro ia em seu apartamento em visita a domicílio. Ele não gostava muito, queria mesmo era ir a clínica, mas já estava difícil demais. Um dia, com a seca no Rio São Francisco, Socorro se pegou olhando para o Rio e perguntou: “Dr Geraldo, será que o rio vai secar?” E ele respondeu com a voz embargada “vai não, ele não faria essa maldade com a gente não”.
Quando o motor do velho tratou parou, demorou um tempo, e Dona Lourdes marcou uma visita a clínica. Só que ela não queria mais ser atendida pela mesma pessoa, gostaria que Socorro, a podóloga de Dr Geraldo a atendesse. A moça retrucou e disse que não era justo, pois ela foi atendida sempre pela colega. “Mas eu preciso ser atendida por você. Foi um pedido que Geraldo me fez. Ele queria que a partir de agora eu virasse sua cliente”, disse ela em lágrimas.

Segurando o choro e engolindo seco ela começou o atendimento. Ela sabia que o desejo dele era que ela não perdesse o cliente com medo de uma perda no seu orçamento. Batia assim o coração do Trator do Sertão.

Carlos Britto

O velho trator e a podóloga

  1. Tereza C S S Coelho disse:

    Socorro, eu tenho as mesmas unhas encravadas que ele. Creio que por duas vezes
    Me valie dos seus magníficos por insistência dele.
    Eu dizia, papai eu tenho a minha em Recife, ele disse, não é melhor que a minha. Foi aí que cheguei ate vc.
    Obrigada pelo carinho dedicado ao amado Pai.

  2. FLÁVIO ALVES DA SILVA DINIZ disse:

    Sou um admirador das histórias da família Coêlho. Já tive a oportunidade de ouvir algumas relatadas pelo meu amigo Luiz Eduardo Viana Coêlho. Essas histórias mantém vivo o legado deste valorosos homens e mulheres do nosso sertão. Obrigado por fazer história em nossas vidas.

Deixe um comentário

O seu endereço de e-mail não será publicado. Campos obrigatórios são marcados com *


Últimos Comentários