Dengue mata médico

por Carlos Britto // 21 de dezembro de 2008 às 23:00

A dengue em sua forma mais grave, a hemorrágica, matou mais uma pessoa em Salvador, a segunda este ano. Um médico, de 63 anos, morador do bairro do Itaigara, cujo nome não foi revelado, morreu no último dia 4 de dezembro.

Ele permaneceu internado no Hospital São Rafael desde 2 de novembro e a causa de sua morte só foi confirmada na sexta-feira, 19, pela Secretaria Municipal de Saúde (SMS). Em 2008, já são 14 óbitos por conta da dengue em todo o Estado.

Segundo a secretaria,  a causa mortis só pôde ser divulgada agora por conta do médico sofrer de problemas cardíacos e de leucemia. Era necessário afastar, então, outras possibilidades que pudessem ter levado o médico à morte.

O segundo óbito confirmado na capital este ano, por conta da dengue, põe em evidência os atuais números da doença na Bahia, que foram divulgados no último dia 15 pela Secretaria Estadual de Saúde (Sesab), em meio à plena movimentação em torno da 1ª Cúpula América do Sul e Caribe, realizada em Costa do Sauípe.

Os dados anunciados são preocupantes e mostram que a  dengue continua avançando na Bahia, sobretudo na sua versão mais perigosa. De maio até a primeira semana deste mês, o número de casos confirmados da chamada dengue hemorrágica subiu 588%, de 34 para 234 ocorrências.

Apesar da gravidade, a Sesab ignora o percentual, que pode ser obtido comparando-se os boletins epidemiológicos dos meses citados. Já o número de casos suspeitos da forma grave registrou até a primeira semana de dezembro um aumento de 498% em comparação ao mesmo período de 2007, respectivamente, 646 e 108 ocorrências.

De acordo com o técnico da Divisão de Vigilância Epidemiológica do Estado (Divep), José Emanuel Araújo, os casos suspeitos, por si só, já demonstrariam  um quadro de alerta. “A gravidade já é considerada nos casos suspeitos. E as medidas são tomadas como se eles já fossem casos confirmados”, argumentou.

Araújo não descarta um risco iminente de epidemia em Salvador, principalmente com a proximidade do verão, quando o ciclo de reprodução do mosquito vetor da doença, o Aedes aegypti, cai de 12 para sete dias. “Por isso, neste período, o risco aumenta”, disse.

Em casa – Sobre o combate à dengue no Estado, Araújo enfatizou a participação da sociedade em prol da eliminação dos focos do mosquito, em cima de um dado: “80% a 90% dos focos estão nas residências”.

O técnico ressaltou que o fumacê, “que é tão cobrado”, não resolve o problema. Segundo ele,  existem na Bahia quatro centrais de aplicação de inseticidas de Ultra-Baixo Volume (UBV), nome técnico do fumacê. Ao todo, são 92 veículos para cobrir toda a Bahia.

Conforme Araújo, a aplicação é indicada em áreas com casos suspeitos da forma grave ou com casos clássicos confirmados. Na capital baiana, este ano, já chegaram a ser usados 15 veículos. “Em Salvador, aplicamos durante o ano inteiro. Mas não resolve e tem que ter critério, porque agride o meio ambiente”, afirmou.

Crianças –  A dengue hemorrágica, a forma grave da doença, avança sobretudo em crianças.  Conforme dados do último boletim da Sesab, 43,9% dos casos atingem menores de 14 anos. Mora aí a explicação do aumento de quase seis vezes do número de casos graves, segundo a epidemiologista especializada em dengue, Glória Teixeira, diretora do Instituto de Saúde Coletivo da Ufba.

Crianças que nasceram a partir de 2000 são suscetíveis ao DEN-2, sorotipo da doença que voltou a circular com intensidade em Salvador em 2007.  “No Brasil, desde 2006, a dengue vem tendo a tendência de aumento, quase se aproximando à grande epidemia de 2002. E esse aumento é atribuído à mudança de circulação do sorotipo”, explicou a especialista.

Na década de 1990, mais precisamente em 1994 e 1995, circularam em Salvador os sorotipos DEN-1 e DEN-2. O DEN-3 só chegou à capital em 2003, predominando até 2006. Significa que muitas crianças não possuem anticorpos, tornando-se vulneráveis à forma grave da doença. “É o que aconteceu no Rio de Janeiro este ano. E nós estamos com muito medo de acontecer aqui um processo semelhante em 2009”, afirmou Glória Teixeira. No Rio, para cada adulto que morreu de dengue hemorrágica, morreram cinco crianças.

Perigo – “A possibilidade de uma epidemia grande (em Salvador) é concreta”, alerta a epidemiologista. A pesquisadora não condena as políticas públicas de combate à dengue e chama atenção da população para tomar as medidas cotidianas de eliminação dos focos de mosquito, como não deixar recipientes de água parada. “80% dos recursos do SUS são destinados para o combate à dengue”, contabilizou

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