A política e o teatro dos horrores

por Carlos Britto // 02 de abril de 2022 às 07:19

Sai, finalmente, de cena a candidatura a presidente da República do ex-juiz Sérgio Moro, no passado o mais audaz inimigo da corrupção, que despiu a toga para servir como ministro da Justiça ao agora promovido a “capitão do povo”, perdeu o emprego e acabou descobrindo que sua vocação é a política.

Descobriu um tanto tarde. Em menos de cinco meses, saiu do partido ao que se filiou (Podemos) e entrou em outro (União Brasil). Para concluir, em menos de 24 horas, que caiu numa arapuca. Imaginou ter sido convidado a trocar de endereço para continuar candidato a presidente. Imaginou errado.

Luciano Bivar (PE), presidente do União Brasil, convidou-o a entrar no partido para ser candidato a senador, ou a deputado federal, ou – quem sabe? – à vaga de Bolsonaro, se ele, Moro, crescesse nas pesquisas de intenção de voto e se firmasse como o mais promissor nome dessa entidade chamada terceira via.

Mas não era para que Moro saísse por aí alardeando isso. Então, Moro disse que sua candidatura a presidente, “no momento“, estava suspensa. Não precisava ter dito, mas disse. Como a mídia entendeu que o que ele queria dizer é que não seria mais candidato a presidente, Moro resolveu corrigir-se, e foi muito pior.

Em um breve pronunciamento no Instagram, disse que não desistiu de nada, o que permitiu a todo mundo, e não só à mídia, concluir que ele não desistiria de ser candidato a presidente. Moro voltou, Moro voltou! – exultaram os moristas de raiz. O retorno durou o tempo de um suspiro. A Bahia pegou em armas contra ele.

A Bahia, não: o ex-prefeito de Salvador, ACM Neto, secretário-geral do União Brasil e candidato a governador. ACM Neto não quer vincular-se a nenhum candidato a presidente para poder ser votado pelos eleitores de todos os candidatos a presidente, inclusive os de Lula. Daí sua reação extrema, mas compreensível.

Com o apoio de quase metade da direção nacional do partido, ele disse que vai impugnar a filiação de Moro ao União Brasil, caso ele se atreva a comportar-se como candidato a presidente. O risco de o União Brasil desunir-se passou quando a outra metade do partido, comandada por Bivar, concordou com ACM Neto.

Tiraram a escada de Moro. O prazo para que ele se filiasse a um terceiro partido esgotou-se às 23h59 de ontem. Vem por aí Eduardo Leite (PSDB), ex-governador do Rio Grande do Sul, a nova aposta dos órfãos de um candidato a presidente. Nem Lula, nem Bolsonaro, mas se não der, mais Bolsonaro do que Lula.

Ora, dirão os crédulos: mas o candidato do PSDB, escolhido em eleições primárias, não é João Doria, ex-governador de São Paulo? Oficialmente, é. Doria derrotou Leite. Mas não será. Porque o PSDB deu as costas a Doria. Mas Bruno Araújo, presidente do PSDB, não escreveu uma carta dizendo que é Doria o candidato?

Escreveu e divulgou na quinta-feira (30/03) à tarde. Mas disse depois que a carta não é garantia de nada, abrindo assim a cancela para a passagem de Leite. Se Leite não azedar antes do tempo, animará o noticiário pelos próximos. Política, pessoal, é teatro, embora nem sempre de boa qualidade.

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