Possibilidade de afastamento de parlamentares divide poderes constituídos do país

por Carlos Britto // 30 de setembro de 2017 às 19:40

A possibilidade de o Supremo Tribunal Federal (STF) suspender o mandato de parlamentares sem aval do Legislativo – mais novo foco de impasse entre os poderes, envolvendo o caso do senador afastado Aécio Neves (PSDB-MG) – divide os principais órgãos da República.

De um lado, Câmara e Senado entendem que uma medida do tipo precisa necessariamente passar pela aprovação da maioria de seus membros, assim como ocorre nos casos de prisão de deputados e senadores, respectivamente.

De outro, a Procuradoria Geral da República (PGR), órgão de cúpula do Ministério Público, além do próprio Executivo, consideram que o afastamento por ordem judicial deve ser cumprido imediatamente, sem necessidade de aprovação do Legislativo.

A controvérsia tomou fôlego nesta semana depois que a Primeira Turma do STF decidiu restabelecer o afastamento de Aécio, que já havia sido suspenso do mandato entre maio e junho deste ano por indícios de que, no cargo, poderia atrapalhar as investigações da Operação Lava Jato.

Nos dias seguintes, sob a influência de alguns dos próprios ministros da Corte, colegas de Aécio convenceram o presidente do Senado, Eunício Oliveira (PMDB-CE), a levar a questão ao plenário da Casa, na próxima terça (3/10).

Nesta sexta (29), a presidente do STF, Cármen Lúcia, marcou para a semana seguinte, no dia 11, o julgamento no plenário da Corte de uma ação para tentar uma solução definitiva sobre o procedimento a ser adotado em caso de afastamento.

O relator do processo é o ministro Edson Fachin, maior responsável pelos casos da Operação Lava Jato no STF. Será ele o primeiro a votar na decisão conjunta na Corte.

Antes, ele pediu manifestações dos principais órgãos da República sobre o assunto. Confiram abaixo como cada um se posicionou:

Partidos

Autores da ação, os partidos PP, PSC e SD protocolaram a ação em maio de 2016, logo após decisões do falecido ministro Teori Zavascki e do plenário do STF de afastar o então deputado Eduardo Cunha (PMDB-RJ) da presidência da Câmara e do mandato parlamentar.

As legendas argumentaram na ação que não há nenhuma regra da Constituição que autorize o afastamento das funções parlamentares e que o STF aplica a medida com base apenas no Código de Processo Penal, sem levar em conta as “especiais prerrogativas” dos deputados e senadores.

O afastamento do mandato ou mesmo a aplicação de outras restrições (como o recolhimento noturno, por exemplo, também aplicado a Aécio), dizem os partidos, “podem afetar o regular funcionamento” do parlamento e, por isso, devem ter o aval dos parlamentares.

Além disso, os partidos argumentam que, pela Constituição, em todas as demais medidas que interferem no mandato parlamentar (prisão em flagrante, perda de mandato ou mesmo suspensão de ação penal), a palavra final é sempre da Câmara ou do Senado.

Por isso, os partidos pedem que uma decisão do STF de afastar um deputado ou senador seja submetida dentro de 24 horas à Câmara ou Senado para que seja confirmada ou rejeitada. Assim como em caso de prisão, a medida só seria efetivada com 257 votos entre os 513 deputados ou 41 entre os 81 senadores.

Câmara e Senado

Em pareceres enviados ao STF, a Câmara e o Senado também defendem que a palavra final sobre o afastamento de deputados e senadores seja de seus pares, para preservar a “autonomia” do Legislativo e as “prerrogativas institucionais” dos parlamentares afetados.

A Câmara argumenta que a proteção aos parlamentares prevista na Constituição de 1988 decorria dos ataques que eles sofriam por parte do Executivo no período militar, podendo ser presos em caso de “perturbação da ordem pública”, por exemplo. No parecer, a Casa nega estar “sustentando a impunidade”.

A Câmara quer que não só o afastamento, mas qualquer outra medida alternativa à prisão que afete a função parlamentar seja submetida ao crivo dos deputados. Entre as medidas, há, por exemplo, obrigação de ficar em casa à noite, proibição de contato com certas pessoas ou de frequência a determinados lugares.

Em sua manifestação, o Senado disse que medidas como essas não interferem no mandato e, portanto, não precisariam de aval da Casa.

Por outro lado, argumentou que, como a Constituição permite que o Legislativo suspenda um processo penal contra um parlamentar, poderá, nesse mesmo tipo decisão, suspender junto qualquer restrição aplicada a ele – seja o afastamento do mandato ou qualquer medida alternativa à prisão.

Presidência e AGU

Em pareceres enviados ao STF, a Presidência da República e a Advocacia Geral da União (AGU), ambos órgãos do Executivo, opinaram pela dispensa de aval do Legislativo para o afastamento de parlamentares. Num parecer enviado em junho pelo presidente Michel Temer, a Casa Civil se limitou a dizer que as medidas alternativas à prisão preventiva previstas no Código de Processo Penal – como o afastamento de funções públicas – não afrontam a Constituição, tendo sido aprovadas pelo Congresso a partir de proposta do Executivo.

O documento não discute a proteção diferenciada dada aos parlamentares pela Constituição, principal argumento dos partidos, Câmara e Senado.

A AGU, por sua vez, diz que o afastamento do mandato não se equipara à prisão do parlamentar, que necessita de aval do Legislativo. A suspensão assim, sendo uma medida menos grave, não precisaria da mesma autorização e caminha no sentido da “progressiva redução e eliminação dos círculos de imunidade de poder”.

O órgão dá como exemplo da diminuição da proteção aos parlamentares uma mudança na Constituição em 2001 que permitiu ao STF processá-los sem necessidade de autorização prévia do Congresso. Para a AGU, tratou-se de um “avanço” que ampliou os mecanismos de controle de freios e contrapesos entre os poderes Legislativo e Judiciário.

PGR

Responsável por processar e acusar parlamentares junto ao STF, a Procuradoria Geral da República (PGR) também não vê necessidade de autorização do Legislativo para afastar parlamentares. O órgão diz que tal exigência contraria a “inafastabilidade da jurisdição”, princípio pelo qual o Judiciário não pode deixar de cumprir seu papel.

A PGR diz que o tratamento especial dado aos parlamentares pela Constituição deve permanecer restrito e não ser ampliado.

Para o Ministério Público, uma proteção excessiva aos parlamentares é prejudicial, já que o afastamento do mandato visa justamente impedir que o deputado ou senador use o cargo para frustrar as investigações. (Fonte: G1-Brasília/foto arquivo reprodução)

Possibilidade de afastamento de parlamentares divide poderes constituídos do país

  1. Cego às avessas disse:

    Só mesmo no bananil que criminoso precisa do aval de outros criminosos para ser investigado pela justiça. É o cúmulo da bizarrice!

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