Artigo do Leitor: “As autarquias em tempos de crise”

por Carlos Britto // 17 de setembro de 2015 às 21:00

Professor Carlos GonçalvesNeste artigo enviado ao Blog, o advogado e professor Carlos Gonçalves faz uma análise nua e crua dos problemas enfrentados pelas autarquias, em especial as de Pernambuco, nesses tempos de crise.
Confiram:

Crise é oportunidade – O caso do Proupe

A crise econômica – tanto no setor público quanto no privado – chegou às Autarquias Municipais de Ensino de Pernambuco. Há meses que o Governo do Estado não repassa regularmente a verba referente às bolsas do PROUPE, um programa estadual de bolsas criado por lei, ainda no governo Eduardo Campos, que visa subsidiar alunos carentes matriculados em instituições de ensino superior das Autarquias Educacionais Municipais existentes no Estado (são atualmente 13 instituições espalhadas por todo o interior do Estado).

Ocorre que já há alguns meses o governo estadual não vem repassando regularmente a parcela do subsídio às autarquias, jogando várias delas – que se tornaram fortemente dependentes do dinheiro do governo – em estado de insolvência, e provocando atraso no pagamento de salários, para dizer o mínimo. As autarquias municipais de ensino, concebidas antes do advento da Constituição de 1988, são entidades públicas que ainda preservam o direito de cobrar mensalidades dos seus alunos.

Nascidas num tempo em que o ensino superior era concentrado nas capitais, a iniciativa ousada de vários prefeitos – com os méritos e deméritos do modelo – serviu para alavancar a qualidade de vida das cidades pequenas e médias e trazer para estas qualificação profissional e aumento de produtividade e renda. Somente em São Paulo são quarenta, sendo a Universidade de Marília um exemplo de que o modelo (entidade pública financiada com recursos privados) funciona e é econômica e academicamente sustentável.

A tentação de depender dos cofres públicos está tão arraigada em nossa cultura patrimonialista ibérica que aparentemente criticá-la é como falar com as pedras no deserto. Sofrendo com a concorrência do FIES (dinheiro público que irriga e sustenta boa parte do ensino privado no Brasil), as Autarquias, parcialmente alijadas do acesso a este sistema em face de suas peculiaridades estruturais e da birra do MEC contra elas (na verdade, para o MEC, os sistemas estaduais de ensino nem deveriam mais existir, seriam uma aberração jurídica que está sendo desmontada pelas beiradas com o avanço da regulamentação onipresente do órgão federal nas brechas da lei), e da expansão do ensino público gratuito federal (que é “apenas” três vezes mais caro por aluno que as IES municipais, sem se questionar seriamente da sua duvidosa eficiência e impacto social), as autarquias pernambucanas viram como sua tábua de salvação a mão estendida do governador para seus crônicos problemas financeiros, uma espécie de “estadualização light” do sistema, que evitava os inconvenientes do transplante jurídico de servidores e patrimônio.

Eis que o caminho mais fácil de repente se torna uma armadilha, um beco sem saída de curto prazo. Acuado pela perda de receita, tanto pela contração das trocas econômicas (e portanto da perda de arrecadação do ICMS) quando dos repasses obrigatórios da União (aliás ocasionada pelo mesmo fenômeno), o Estado de Pernambuco teve que tomar decisões amargas para manter em dia sua própria folha, aposentadorias, serviços de segurança, saúde, entre outros.

Então o PROUPE, pelo menos por hora, foi pro saco. E várias Autarquias, que dependiam do dinheiro estadual, estão em estado pré-falimentar.

Quem tinha pouca exposição ao risco – seja porque apenas uma pequena parte da sua receita dependia do subsídio, seja porque praticou um planejamento financeiro de modo a não depender deste dinheiro para pagar as despesas correntes, ou ambas – escapou mais ou menos ileso da situação vexatória pela qual algumas Autarquias estão passando, de não saber se vão pagar o salário dos professores no mês que vem.
Enquanto os salários dos professores e servidores da Facape – apenas para citar um exemplo – estão sendo pagos em dia, e parte do décimo-terceiro salário já foi depositada, há professores de outras entidades co-irmãs que estão hoje nas mãos de agiotas para fechar as contas do mês.

Esta crise, que promete ser mais longa que as anteriores da História recente, nos traz uma lição amarga, que contradiz o senso comum e mesmo os interesses de vários grupos de pressão, mas que tem que ser vista de frente, sob pena de continuarmos a repetir os mesmos erros, ad infinitum: o modelo de ensino superior público gratuito, mantido via tributos, não resiste a uma crise econômica ou à incompetência gerencial. Contra fatos…

Carlos Gonçalves/Doutor em Direito pela UFPE, Advogado e Professor da Facape

Artigo do Leitor: “As autarquias em tempos de crise”

  1. Adão Lima de Souza disse:

    O maior problema das autarquias, hoje, são os super salários pagos a professores que em hipóteses alguma conseguiria ganhar tanto dinheiro se fosse considerado o mérito deles. Porém, numa autarquia todo mérito se resume a ser amigo do rei para ocupar os diversos e lucrativos cargos de confiança. A FACAPE não destoa disso.

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